O Fogo em si é uma substância que escapa a todas as análises químicas. Os cientistas dizem que o fogo é produto da combustão, mas isso ê completamente falso. Ninguém conhece a natureza do Fogo.
Sabemos, por exemplo, que na atmosfera há oxigênio e nitrogênio. Não ignoramos que na fórmula da água (H2O) estão o hidrogênio e o oxigênio. Tampouco podemos ignorar que o carbono está na terra. Mas, qual é na realidade a fórmula do elemento fogo?
Qualquer cientista nos falaria do H2O, de que são necessários dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio para formar água. Porém, façamos o ensaio com o H2O. Tratemos de unir os átomos de oxigênio com os de hidrogênio em um laboratório para ver se o resultado é água. É claro que não. Por quê? Porque falta algo. O que? O elemento Fogo. Portanto, a fórmula H2O está incompleta; isso é óbvio.
Realmente, o fogo escapa a todos. Uma simples chama, como a que temos aqui na vela, seria suficiente para incendiar o mundo, e ela permaneceria impassível, não aumentaria um átomo a mais, nem a menos. De qualquer vela acendemos outra vela, e outra, e outra, e outra e queimamos um depósito de gasolina, fazemos explodir um depósito de dinamite e segue o fogo; queimamos o mundo e a vela permanece impávida, como se nada tivesse acontecido.
Que tipo de substância é esta que zomba dos químicos e que produz tantos prodígios? E que no entanto não se altera, permanece impassível? Realmente, a substância do Fogo é divina.
Mas o que nos interessa é a parte oculta do Fogo, a chama da chama, a assinatura astral do fogo, aquilo que é o divino. É isso que vemos lá na cruz, o INRI: Ignis Natura Renovatur Integram (o Fogo renova incessantemente a Natureza). A liberação do ser humano não é possível fora do fogo. Só trabalhando com o fogo podemos conseguir a libertação final.
Os mundos, por exemplo, não são senão granulações do Fohat. A doutrina que ensinamos é a doutrina do Fogo, os livros que escrevemos foram escritos com carvões acesos e entre o crepitar ardente das chamas fazemos o conhecimento secreto chegar á humanidade.
Bem sabemos que por trás do fogo há maravilhas. Uma vez perguntou-se a um grandioso elemental do Fogo: “O que há além do fogo?” Ele respondeu: “Isso é coisa que ignoramos.”
“Deus é um fogo devorador”, diz São Paulo, e assim é.
Em passadas conferencias, dissemos que havia dois Unos. O incognoscível Aelohim e o cognoscível Elohim. Aelohim é a seidade incognoscível e imanifestada, enquanto que Elohim é o Exército da Voz, o Exército da Palavra, que é como a Estrela Polar, como o Sol Espiritual, o Sagrado Sol Absoluto, que sai das entranhas do Incognoscível.
O Exército da Palavra emana do Sagrado Sol Absoluto, porém o Sagrado Sol Absoluto e o Exército da Palavra são Um, que saiu das entranhas vivas do Incognoscível. O Exército da Palavra é Fogo, é Fohat pluralizado, mas não devemos esquecer que a variedade é a unidade. O Exército da Voz é constituído por todos esses milhões de Dhyân-Chohans criadores do universo, e todos eles são chamas de fogo ardente.
Vejam como é grandioso esse desdobramento de Brahama, esse desdobramento da divindade, esse desdobramento do grande fogo universal. Vejam como do Incognoscível emana o Demiurgo Arquiteto do Universo, que é Fogo. Agora, todo esse Exército da Palavra, todo esse exército de Dhyân-chohans obviamente está ordenado, classificado em grupos, segundo as idéias cósmicas universais. Eles são números vivos que criam e voltam novamente a criar.
Convém entender que do seio do Incognoscível brotou realmente o Logos, o Demiurgo, o Sol Estelar Espiritual, o Exército da Palavra. Por sua vez, desse Logos múltiplo, como uma chama composta de muitas chamas, emana Atman, o inefável. Atman é o Íntimo em cada um de nós, nosso espírito divino, o inominável.
Por sua vez, de Atman desprende-se Buddhi. Que é Buddhi? Buddhi é a consciência superlativa do ser. Buddhi é Eros, o Fohat mensageiro dos deuses. Nos mundos superiores da consciência cósmica, os Iniciados podem evidenciar o fato concreto de que Atman sempre envia a Eros, o Fohat, o Buddhi, ou a Valquíria, como diríamos na linguagem clássica de Wagner, para realizar determinados trabalhos. De forma que Fohat ou Buddhi é o mensageiro de Atman.
De fato, nos enchemos de êxtase ao compreender a realidade de Eros, e ficamos admirados diante das Valquírias dos Mahatmas, ao vê-las trabalhando nos mundos superiores da consciência cósmica, levando mensagens a todos os rincões do Universo, mulheres inefáveis, de indescritível beleza. As Valquírias trabalham nos templos, entregando mensagens, ajudando aos Mahatmas. Elas são o Fohat mensageiro, o extraordinário Eros que palpita em cada um de nós.
Que seria de nós sem Eros? Como poderíamos realizar a Grande Obra do Pai? Nós precisamos de Eros para poder desintegrar os agregados psíquicos inumanos que em nosso interior carregamos.
Assim, a estrela que se desprendeu do Sagrado Sol Absoluto é o Demiurgo criador do Universo, é a chama da qual saem sete chamas santas.
Essa chama é tríplice, porém dela saem sete chamas, isto é, da tríplice chama sai o eterno Heptaparaparshinok, do três sai o sete. Assim como podemos com três velas acesas acender sete, assim também a chama de três pavios, que é o Logos; o Logos como Santo Afirmar, Santo Negar e Santo Conciliar. Dessa tríplice chama desprende-se o eterno Heptaparaparshinok, as sete chamas.
Atman e Buddhi formam a Mônada Divina interior de cada um de nós. Depois vem o Manas Superior, ou Alma Humana, o que temos de humano.
Em seguida vem essa mente que usamos para pensar e que infelizmente está enfrascada nos múltiplos agregados psíquicos que constituem o Mim Mesmo, o Si Mesmo, o Eu Mesmo; motivo pelo qual dizemos que não temos uma mente, e sim muitas mentes. É óbvio que se a substância mental está engarrafada em diferentes frascos, se encontra dividida entre eles, enfrascada em muitos Eus, já não há infelizmente uma só mente e sim muitas mentes.
Mas o que se esconde por trás de todas essas mentes é o radical, o Fogo, que seria na realidade o quarto fogo, porque o quinto está por trás de todas essas emoções que temos, e que o Iniciado autêntico tem no Corpo Astral. A sexta chama está por trás do princípio da vida, é o prana, é o fogo como prana ou vida. O sétimo fogo arde na própria medula espinhal do asceta gnóstico.
Na realidade e em verdade, falando do ponto de vista da anatomia oculta, diremos que existem sete serpentes: dois grupos de três com a coroação sublime da sétima língua de fogo que nos une com o Uno, com a Lei, com o Pai.
Se Atman recebe na realidade e de verdade o princípio ígneo do fogo do Incognoscível, por mediação do Demiurgo criador do universo, não há dúvida de que tudo vem a ficar contido no Buddhi.
Com justa razão nos foi dito que Buddhi é como um vaso de alabastro fino e transparente, através do qual arde a chama de Prajna. No Buddhi, na Walquíria, no Eros, na Donzela, na bela Helena de Tróia, está contido Atman, o inefável. Mas, por fim, Atman-Buddi como Mônada são radicais.
Já disse que temos que trabalhar com os sete radicais, que são os sete aspectos do fogo em nós, as sete línguas de fogo da anatomia oculta que emanam diretamente do Divino Arquiteto do Universo. Isso é óbvio e assim há que ser entendido.
A Seidade, em si mesma incognoscível, é o fundamental; dela emana o Fogo. Sat é Seidade e da Seidade emana o Fogo, isto é, o Demiurgo Arquiteto. Mas há um ponto que quero ressaltar. Se bem é certo que o Santo Negar, o Santo Afirmar e o Santo Conciliar, isto é, o Logos interior de cada um de nós, é radical, ele é o Buda Íntimo de cada um de nós, porque cada um tem seu Buda Íntimo, ainda que não o tenha encarnado. Esse Buda Íntimo por sua vez emana de Adybuddha e Adybuddha é o Incognoscível.
Individualizando, diríamos que cada um de nós tem seu Adybuddha no incognoscível Espaço Abstrato Absoluto. Dele emana nosso Logói; já estou particularizando e concretizando. E do Logói, por sua vez, emanam os sete aspectos do FOHAT, do fogo.
Quando digo que há que se trabalhar com o fogo, tudo deve ser bem entendido. Precisamos ter um pouco mais de consciência sobre o que é o fogo, há que entendê-lo melhor. A Mãe Kundalini, de quem tanto falamos, é fogo, é o Fohat em nós, em nossa anatomia oculta, é uma variante, uma derivação do nosso próprio Ser.
Sim, precisamos trabalhar com Ela, com o fogo, porque Ela é a portadora do fogo. Ela, a serpente ígnea, se revolve aterradoramente nos candelabros do templo. Essa cobra sagrada dos grandes mistérios é fogo que crepita na aura do universo. Só Ela pode reduzir a cinzas os agregados psíquicos inumanos que carregamos em nosso interior.
Não é coisa fácil desintegrar a totalidade dos agregados psíquicos, pois esses agregados se processam em sete níveis do Ser. Há santos que conseguiram desintegrar agregados até o quinto e o sexto níveis, mas muito raro é aquele que consegue desintegrar seus agregados psíquicos nos sete níveis do Ser. Acontece que nos últimos níveis, especialmente no sétimo, tais agregados tornam-se terrivelmente sutis e costumam ser espantosamente difíceis. Se o Iniciado não é suficientemente compreensivo, pode fracassar na Grande Obra.
Nos níveis superiores do Ser existem coisas surpreendentes. As máximas morais não servem para o sétimo nível de trabalho, nem para o sexto... Os códigos de ética ficam sobrando, os conceitos que se tinha, baseados em interpretações meramente superficiais sobre as Sagradas Escrituras, ficam destruídos.
O Iniciado tem que se tornar independente, não somente das forças do mal, como também das forças do bem. Terá de lutar contra as potências do mal e contra as potências do bem.
Em última síntese, o bem se torna mal e muitos aspectos que pareciam ser do mal se tornam do bem. Há que se passar além do bem e do mal para conhecer o bom do mal e o mal do bom. As estruturas dogmáticas da ética convencional no fundo só servem de escombros para o que avança pela senda da auto-realização. Esta é a crua realidade dos fatos.
Há uma tendência nas pessoas de tudo interpretar a seu modo, superficialmente. Quem quiser trabalhar no sétimo nível tem que ser estritamente compreensivo, precisa passar além dos dogmas e fazer um inventário de si mesmo para ver o que é que lhe sobra e o que é que lhe falta.
Muitas vezes, uma bela virtude pode servir de escolho ao navegante. Às vezes, até preciosas gemas da espiritualidade se tornam obstáculos. Por isso, é tão difícil desintegrar os agregados psíquicos nos sete níveis do Ser.
Por outro lado, há que aprender a manobrar os cinco cilindros da máquina orgânica porque os agregados que possuímos estão relacionados com esses cinco cilindros. Quais são esses cinco cilindros? Centro intelectual. Onde está? Já sabemos que no cérebro. Centro emocional. Onde está? No coração, plexo solar e sistema nervoso grande simpático. Centro motor. Onde está? Parte superior da espinha dorsal. Centro instintivo. onde está? Na parte inferior da espinha dorsal. E o centro sexual? No sexo.
Há agregados psíquicos do centro intelectual, como os há do centro emocional, no centro motor, no centro instintivo e no centro sexual; isso é óbvio. Temos de estudar os agregados psíquicos em cada centro para ver como se comportam e isso é questão de auto-reflexão, experiência direta, observação psicológica...
Em todo caso, os agregados não podem ser desintegrados sem a ajuda da Divina Mãe Kundalini, a cobra dagrada dos grandes mistérios. E Ela exige, para a desintegração de qualquer agregado psíquico, prévia compreensão do defeito psicológico que queremos reduzir a cinzas. Isso é óbvio, primeiro temos de descobrir o defeito e depois trabalhá-lo.
Necessitamos da auto-reflexão evidente do Ser para chegar a uma profunda compreensão. Necessitamos da meditação íntima, se é que queremos realmente entender tal ou qual defeito. Agora, uma vez compreendido, há que trabalhar com a divina cobra dos grandes mistérios; somente assim conseguiremos eliminá-los.
Repito: qualquer defeito está sempre relacionado com um centro da máquina orgânica. Mas com a ajuda do Fogo, desse Fogo que vem do Demiurgo Criador do Universo para manifestação através de todos os níveis do Ser, podemos reduzir a cinzas qualquer elemento psíquico indesejável.
Vocês têm que se familiarizar um pouco mais com o fogo, pensar com o fogo, aprender a sentir com o fogo... Precisam adorar o fogo como o fazem os persas ou os cristãos quando exclamam: “Deus é um fogo devorador”!. Fazer como os Parsis, que adoram o fogo, como os membros de qualquer tribo maia, tolteca, zapoteca ou inca que rendem culto ao fogo. Isso no fundo pertence ao paganismo puro, e ao mais delicioso esoterismo cristão.
De todos os centros que temos em nosso organismo, não há dúvida que o mais difícil de controlar é o centro emocional. O intelectual, ainda que custe muito trabalho, ao final de certas disciplinas pode ser ou menos controlado. O motor, que é o produtor dos movimentos e que está situado na parte superior da espinha dorsal, também é controlável. Alguém pode controlar os movimentos do seu corpo, caminhar se quer caminhar, levantar um braço se quiser levantá-lo ou não levantá-lo se não quiser, enrugar o cenho ou não enrugar, etc. Assim, toda a atividade do centro motor está sob o controle da vontade.
Agora, o centro emocional é terrível. Essa questão das emoções negativas, do sentimento e do sentimentalismo, torna-se muito difícil de poder controlar. Na Índia, por exemplo, comparam o centro emocional a um elefante louco. Que fazem para controlá-lo? Colocam-no lado a lado a dois elefantes sãos, obedientes, e os amarram para não irem embora. Por fim, os dois elefantes sãos ensinam o elefante louco a ser obediente.
Muito bem. O centro emocional é um elefante, o motor e o intelectual também o são. Estes dois elefantes, o intelectual e o motor, podem controlar o elefante louco das emoções. Se em um momento estamos para explodir de desespero ou de angústia, se nos identificamos com uma emoção negativa, estamos mal. Que devemos fazer? Deitar-nos na cama, relaxar e por a mente em branco. Ao relaxarmos, estamos atuando sobre o centro motor, relaxamos todo o corpo, afrouxamos os músculos e aliviamos a tensão no organismo. Ao pôr a mente em branco, isto é, ao levar a mente á quietude e ao silêncio, que acontece? Ao centro emocional não resta outro remédio do que se acalmar um pouco, ir serenando. Por fim, o centro intelectual e o motor vêm a dominar o emocional, são dois elefantes obedientes que terminam dominando o elefante louco.
Também ê possível se controlar as emoções inferiores mediante as emoções superiores. Há muitos tipos de emoções inferiores, vocês sabem. Se morrer um familiar, gritamos, choramos, ficamos desesperados... Por quê? Porque não queremos cooperar com o inevitável. Isso é o pior. Qualquer pessoa na vida deve aprender a cooperar com o inevitável. Se morrer um ser querido, não nos conformamos e gritamos cheios de angústia; não aceitamos. Vemos seu corpo dentro do féretro, mas não nos parece que esteja morto, não acreditamos, não é possível para nós que esse ser tenha morrido, e nos entregamos á angústia e á desolação.
Isso é terrível. Como poderíamos dominar esse estado? De duas maneiras: Poderíamos apelar ao par de elefantes: o centro motor e o centro intelectual. Relaxar o corpo e por a mente em silêncio; seria um sistema. O outro seria apelar para uma emoção diferente, uma emoção superior. Talvez nos faça muito bem nesses momentos escutar uma sinfonia de Beethoven ou A Flauta Mágica de Mozart. Podemos ainda submergir cheios de emoção em uma meditação profunda, refletindo sobre os mistérios da vida e da morte. Portanto, através de uma emoção superior, controlamos as emoções inferiores e anulamos a dor que nos causa a morte de um ser querido.
O centro emocional é muito interessante, mas temos que dominar as emoções inferiores, controlá-las e submetê-las; isso é possível de acordo com nossa didática. As emoções inferiores causam muito dano. Emoções inferiores como as das touradas, emoções inferiores como as do cinema, emoções inferiores como as das orgias e das grandes jogatinas, emoções inferiores como as de quem ganha na loteria, como as de quem se emociona com as notícias dos jornais sobre uma guerra ou sobre tantas coisas que há no mundo, emoções inferiores como as de quem bebe cachaça, emoções inferiores como as que as pessoas desenvolvem em todas suas bestialidades, não servem senão para fortificar os agregados inumanos que carregamos nosso interior, e ainda para criar outros novos.
Precisamos eliminar as emoções inferiores através das emoções superiores; isso é possível. Precisamos aprender a viver uma vida edificante e essencialmente dignificante; isso é fundamental. Do contrário, progresso algum será possível. Como? De que maneira?
Precisamos ser mais sinceros para com nós mesmos, a fim de desenvolver o centro emocional superior e nos libertar das emoções meramente negativas e superficiais. Há pessoas que são gentis conosco, decentes, pessoas oferecem aos outros a sua amizade. Mas esse é o procedimento público ou exotérico, diríamos, porém não é tudo. Sabendo que se tem uma psicologia interior, não basta somente se comportar decentemente diante de outras pessoas, não basta somente a fragrância da amizade do ponto de vista externo.
Qual é o comportamento que se tem internamente para com as outras pessoas? Normalmente, quem brinda amizade ás outras pessoas tem duas facetas: a de dentro e a de fora. A de fora é magnífica aparentemente, mas e a de dentro, quem a conhece?
Estamos certos de que não criticamos o amigo a quem temos tanta estima? Estamos certos de que não sentimos antipatia por alguma de suas facetas? Estamos certos de que não o estamos atraindo para alguma armadilha, que temos na mente para torturá-lo, para fazer escárnio dele enquanto sorrimos docemente? Quantos estimam a alguém, mas não deixam de criticá-lo em seu interior, ainda que não exteriorizem suas críticas. Fazem escárnio de seus melhores amigos, ainda que sorriam docemente na sua presença.
Realmente, devemos ser mais completos, mais íntegros. Tratemos de por um momento colocar os dois relógios, o de fora e o de dentro, o exterior e o psicológico, em igualdade de ritmo; que andem em perfeita harmonia um com o outro. De nada serve que estejamos nos comportando bem com nossas amizades, que estejamos oferecendo a elas nosso carinho, se por dentro estamos escarnecendo delas, se por dentro as estamos criticando, se por dentro as estamos torturando...
O melhor é que os dois relógios, o exterior e o interior, caminhem uníssonos de segundo em segundo, de instante em instante. Devemos ser mais íntegros, mais completos, abandonar a crítica mordaz, psicológica, interna, às pessoas que estimamos. Como é possível esta contradição, que estimemos uma pessoa e por dentro a estejamos criticando? Estamos até falando bem dessa pessoa a quem estimamos, mas por dentro a estamos devorando viva.
Agora, vocês sabem muito bem que dentro de cada um de nós vive muita gente; vivem todos os “Eus”.
Quando alguém pega um desses eus e o estuda com o sentido da auto-observação psicológica, pode evidenciar que ele tem os centros intelectual, emocional e motor-instintivo-sexual, isto é, que tem os três cérebros. Todo eu tem mente engarrafada, tem vontade engarrafada, é uma pessoa completa. Assim é que dentro de nós existem muitas pessoas, dentro de cada pessoa vivem muitas pessoas: os agregados psíquicos.
Assim, qualquer amizade que tenhamos, merece ser devidamente tratada. Por exemplo, vocês têm um amigo. Há coisas desse amigo que lhes agradam e há coisas que lhes desagradam. Isto é, vocês são amigos de algum eu de seu amigo ou de uns quantos eus, mas há outros eus que lhes aborrecem, que lhes causam antipatia. Temos de ter em conta que dentro de cada pessoa se manifestam muitas outras pessoas. Vocês são amigos de determinados agregados de tal ou qual amigo, de tal ou qual pessoa, porém não são amigos de todos os agregados desse amigo.
Por isso dizem: “Há coisas em tal sujeito que me agradam e há coisas que não tolero. Ele tem coisas boas e tem coisas ruins”. Esta é a maneira que usamos para falar. Tudo depende do agregado que em dado momento esteja falando. Logo, a amizade que sentimos por outra pessoa não é completa. Só sentimos amizade por uns quantos agregados dessa pessoa. Não sentimos carinho por todos os agregados dela. Pode ser que a pessoa fisico-psicológica que estimamos tenha agregados psíquicos que não estimamos. Assim, em certas horas, essa pessoa se torna desagradável justamente porque nela estão se expressando agregados pelos quais não temos amizade alguma. Esta é a crua realidade dos fatos.
Se tivéssemos um eu permanente, diríamos: Sou amigo do fulano de tal de forma total, completa; não encontraríamos nele nem “mas” nem “porém” de espécie alguma. Acontece que não há um eu permanente, e sim muitos eus. Então, a qual desses agregados ou a quais desses eus do sujeito X é que estimamos? Não será a todos. Por causa disso, precisamos ser compreensivos na questão do relacionamento. Por que brigam os amigos? Simplesmente porque de repente intervém dentro da personalidade de um deles um agregado que não é amigo do amigo e surge a discórdia. Mas, se esse agregado se retira e intervém outro que seja amigo do amigo, aí fazem as pazes.
Que fátuas são as amizades! Não são completas, e não são completas porque não são compreensivas, não entendem essa questão da pluralidade do Eu. Se o fossem, seriam completas e saberiam desculpar os defeitos do amigo e não brigariam com ele. Falta-nos este conhecimento, para que não briguemos com nossos amigos. Precisamos nos tornar mais conscientes disso. Assim, melhoraremos o relacionamento, a convivência.
Há simpatias e antipatias que podemos chamar de mecânicas. Nem uma nem outra serve porque são mecânicas. Às vezes, dizemos que fulano de tal é antipático. Mas, o que é isso que é antipático do fulano de tal? Um agregado psíquico que possivelmente não é nosso amigo; isso é tudo.
Não devemos tratar de criar simpatia à força com alguém que antipatizamos e sim, antes de tudo, descobrir qual é a causa da antipatia. Quando descobrimos, à base de reflexões, que essa antipatia é mecânica, ela desaparece e por este motivo sobra a simpatia. Como poderíamos ou que base poderia nos servir para chegar á conclusão de que uma simpatia é mecânica? Simplesmente compreendendo a pluralidade do Eu, já que é indubitável que dentro de uma pessoa vivem muitas pessoas.
Há vezes que em determinada pessoa, em determinado sujeito, expressam-se alguns agregados que não nos agradam; isto é mecânico. Reflitamos no fato de que dentro dessa pessoa que nos causa antipatia também há agregados que nos podem ser simpáticos, que nos podem ser prestativos e amigos... Que nem todos os agregados que se manifestam em tal sujeito são desagradáveis para nós.
Pode ser que se manifeste no certo fulano que não nos agrada algum agregado que nos agrade. Se refletirmos nisso, compreenderemos que do ponto de vista da pluralidade do eu desaparece a antipatia mecânica, a qual é bastante prejudicial , porque desenvolve cada vez mais aos elementos psíquicos inumanos que estão relacionados com o centro emocional negativo.
Quanto mais formos eliminando os agregados psíquicos do centro emocional, mais e mais irá se desenvolvendo em nós o centro emocional superior. Acrescento que o centro emocional superior é grandioso, muito mais poderoso que o intelecto. Com o centro emocional superior, poderemos compreender a natureza do fogo. Os livros sagrados foram escritos com carvão em brasa, isto é, com fogo. A linguagem da Bíblia, por exemplo, é em parábolas, é a linguagem do centro emocional superior. As experiências místicas e incorpóreas são obviamente parabólicas e somente podem ser entendidas com o centro emocional superior. Os mistérios da vida e da morte são perfeitamente cognoscíveis através do centro emocional superior.
Já lhes disse que a Mônada é o que há de mais importante em nós e que, quanto mais formos eliminando os elementos psíquicos inferiores, mais e mais iremos recebendo as radiações da mônada. Ela é Atman-Buddhi e Atman é o Inefável. É ele quem recebe a força que vem do Demiurgo criador. O Demiurgo por sua vez a recebe de Adybuddha, a Seidade Incognoscível. Atman, como desdobramento do Divino Arquiteto do Universo, é inefável, é o que se poderia chamar Paramatman ou Shivatatwa. Buddhi, apesar de ser também espiritual, é mais corpóreo, mais concreto que Atman. Buddhi-Eros como princípio ígneo obviamente vai se tornando cada vez mais evidente em nós, suas radiações nos vão chegando cada vez mais fundo á medida que formos dissolvendo as emoções negativas do centro emocional e conforme o centro emocional superior for se desenvolvendo. Atman-Buddhi é a Mônada, é a realidade dentro de nós, aquilo que conta, o Real Ser em nós.
Temos de lutar muito, eliminando emoções negativas, para irmos nos aproximando cada vez mais da Mônada e esta nos ajuda, porque justamente de Buddhi emana Eros, que é a força sexual extraordinária com a qual podemos desintegrar os agregados psíquicos na Forja dos Ciclopes. Que seria de nós sem Eros?
A Eros se opõe Anteros, as potências do mal, as quais não estão fora e sim dentro de nós, aqui e agora. São todos esses agregados do centro emocional inferior; isso é Anteros. Conforme formos eliminando as emoções negativas e desenvolvendo o centro emocional superior, iremos penetrando cada vez mais na essência do fogo, iremos nos aproximando cada vez mais de nossa Mônada interna, a qual sempre nos sorriu. Não se esqueçam que o centro emocional em princípio é puro, radiante... $ão as emoções inferiores situadas nas partes inferiores do centro emocional que constituem o emocional inferior. Por isso, se eliminarmos as emoções inferiores, tudo fica perfeito. O centro emocional superior é como uma magnífica flor de lótus.
Em todo caso, Atman é o raio que nos liga ao Logos e ao Adybuddha. A força do Adybuddha e do Logói interior chega a Atman e fica contida em Buddhi, porém a aproximação a Buddhi é impossível enquanto se tenha emoções negativas. Em outros termos, a aproximação à Mônada torna-se difícil se continuamos com emoções inferiores. Não devemos aceitar emoções inferiores dentro de nós; devemos cultivar as emoções superiores. Quanto á música, devemos escutar Beethoven, Mozart, Listz, Tchaikowsky, etc. Devemos aprender a pintar, porém que os quadros que pintemos não sejam infra-humanos. Devemos verter neles os nossos sentimentos mais nobres. Tudo o que fizermos deverá ser dignificante e essencialmente edificante.
Quanta gente não se enche de êxtase ao contemplar as colunas coríntias dos tempos antigos, feitas com os mármores de Roma e de Atenas, ou as magníficas esculturas de uma Ísis morena na terra dos faraós, de um Apolo, de uma Vênus de Milo, de uma casta Diana, etc. Quanta gente não se enche de êxtase, vibra com emoção superior, ao escutar, por exemplo, a lira dos tempos antigos, ao entregar-se á meditação profunda no seio da natureza, ao passear pelas ruínas da antiga Roma, ao caminhar pelas margens do Ganges ou ao cair de joelhos diante do Guru nas neves perpétuas do Himalaia; é quando vibra a emoção superior.
Nos antigos tempos, lá na Lemúria, nas épocas em que os rios de água pura vertiam leite e mel, quando ainda a lira de orfeu não tinha caído no pavimento do templo fazendo-se em pedaços, o centro emocional superior vibrava intensamente em cada ser humano. Essa foi a época dos titãs, a época em que os seres humanos que povoavam a superfície da Terra podiam ver a aura dos mundos e perceber mais que a metade de um holtapamnas (tonalidades de cor); bem sabemos que um holtapamnas tem mais de cinco milhões de tonalidades. Porém, quando o centro emocional inferior se desenvolveu com as paixões violentas, com a luxúria, com o ódio, com as cruéis guerras entre irmãos, aquele sentido se atrofiou e a humanidade ficou presa neste mundo tridimensional de Euclides.
Chegou a hora de entender que só mediante o Centro emocional superior é possível se penetrar mais profundamente em nós mesmos. Se procedemos com retidão, se aprendemos a viver, se aprendemos a nos relacionar com nossos semelhantes de uma bela forma, então nos aproximaremos mais e mais da Mônada sagrada e diferentes cintilações de consciência cósmica irão nos surpreendendo, irão se fazendo cada vez mais contínuas. Por fim, um dia, teremos todos na realidade e em verdade a consciência desperta, a consciência superlativa do Ser, Buddhi. Nesse dia, seremos felizes, nesse delicioso amanhã, as vibrações de Buddhi nos saturarão totalmente e saberemos viver de verdade em estado consciente e perfeito. Até aqui esta cátedra.